A Bola

por janeiro/2013Crônicas0 Comentários

Atenção, pessoal da esquina, mais uma estória para vocês. Lá pelos anos de 1968 ou 1970, mais ou menos, no bairro no qual eu morava em São Gonçalo, existia um amigo meu que era conhecido por “Bonito”, não sei o porquê do apelido, ou melhor, sei sim. “Bonito” era um rapaz que tinha todos os dentes estragados, já que nunca tinha ido a um dentista. Por falta de dinheiro, pois o seu pai era um operário humilde e sem instrução nenhuma e sua mãe também semi-analfabeta, razão pela qual não ligavam para os dentes do menino. O importante era ter o feijão, arroz e farinha para “bonito” e seus cinco irmãos menores. “Bonito” também corria da ideia de ir ao dentista por medo, ou melhor, pavor, na época do Grupo Escolar, ele ficava sempre “doente” quando era o dia de ir ao dentista.

Quando “Bonito” se apresentou ao Exército para prestar serviço militar, não teve como escapar do dentista, que ficou muito impressionado com o estrago na boca do rapaz. Sem outra solução ele teve que extrair todos os dentes.

A rapaziada do bairro começou a chamá-lo de “sorriso vazio”, “vovô”, “deserto do Saara”,” boca murcha” e outros apelidos menos votados. Em razão da gozação, “Bonito” se entocou, não saia de casa para nada, exceto para ir ao quartel.

O papo da rapaziada naquela semana era o baile que se realizaria no sábado, último dia do ano, no Clube dos Embaixadores, um clube modesto de São Gonçalo. O baile seria com nada mais nada menos que o Conjunto The Fevers, o quente na época.

No sábado, por volta das 21 horas, já que o baile seria de 23 às 4 horas, a rapaziada se reuniu no boteco do Sr. Inácio para tomar uma batida de limão, comprar um cigarro no varejo e um chiclete, para impressionar as “minas”. A rapaziada já estava de saída, quando não se sabe de onde surgiu aquela figura na porta, com um sorriso de orelha a orelha. Era ele sim, o “Bonito” de dentadura novinha em folha. Ele contou a todos que tinha dado baixa do quartel e que o dentista do Exército fez aquela dentadura para ele por um preço bem em conta e tendo pago com o soldo militar.

– Chega de papo, vamos embora pro baile que eu quero recuperar o tempo perdido – Falou o “Bonito”.

No baile, “Bonito” tava que tava, não perdia música, gastou o solado. Sempre com um sorriso total no rosto, feliz e feliz.

Quase no final do baile, depois de alguns copos de cuba-libre, “Bonito” passou por mim e disse: – Viu aquela lourinha que estava dançando comigo? Já está no “papo”. Deixa-me ir que vai começar a última parte.

De repente, um desastre. O salão estava cheio, “Bonito”, boca aberta, sorrindo. Alguém esbarra, a dentadura cai no chão, “Bonito” não consegue se abaixar para apanhar a dentadura, ele coloca a mão na boca e sai correndo.

Terminou o baile, alguém gritou: – Esqueceram uma “mobília” no chão. Quem é o dono da “cremilda”?

Eu já me preparava para ir apanhar a dentadura do meu amigo, quando alguém gritou:

– Goool, logo após ter dado um chute na dentadura. E como brasileiro não gosta de futebol, todos passaram a chutar a “bola”.

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