O Sorriso do Juquinha

por junho/2017Crônicas0 Comentários

O meu amigo Astrogildo, depois de trinta anos de casado com Dona Marieta, uma santa mulher, sentia uma falta danada dos primeiros anos de casado, quando ele tinha pleno domínio da situação, ele era o dono da cocada preta. Não tinha pra ninguém. Depois com o passar do tempo vieram os filhos, ai ele perdeu 50% do seu reinado, depois vieram os netos, lá se foram os outros 50%. Meu amigo ficou sem reinado e sem coroa.

É, mas não foi só isso. Dona Encrenca, não satisfeita, arranjou um tal de Juquinha, que passou a ser seu queridinho. Era meu amorzinho pra lá, meu amorzinho pra cá. O tratamento do Juquinha era VIP, enquanto isso o Astrogildo vivia a pão e água. No início comia bem todos os dias, depois uma vez por semana e ultimamente uma vez por mês: as dores de cabeça de dona Marieta eram constantes.

Já ia esquecendo-se de dizer quem era o Juquinha. Ele era um cachorro, que vivia espalhando suas fezes pela casa toda, parecia até um sabiá, não parava de sujar.

Astrogildo tinha uma bronca do Juquinha terrível, principalmente quando via dona Marieta fazendo carinho no Juquinha, carinhos que outrora eram todos seus.

Um belo dia surgiu, na repartição na qual o Astrogildo era o chefe, uma nova secretária, que na flor dos seus trinta anos encantara a todos, principalmente ao Dr. Astrogildo (sim, lá ele era chamado de doutor). A nova funcionária tinha ficado viúva a menos de um ano, estava carente, o Astrogildo também. Embora sério e respeitador, o meu amigo passou a criar minhocas na sua cabeça. A Mimi (sim, era esse o apelido da Mirtis) foi alimentando as minhocas. Então disse que sentia saudade do cachorro quente na beira da praia com o seu ex-marido, e pediu ao Dr. Astrogildo para levá-la uma noite dessas.

Em casa, Astrogildo falou com a sua esposa: “hoje vou ter uma reunião na repartição, não tem hora de terminar” e, pegando aquela velha japona de guerra, foi saindo. Dona Marieta comentou: “tá um calor danado, não precisa levar o agasalho”. “O ar condicionado na repartição é muito forte, principalmente à noite”.

Dona Marieta resolveu levar o Juquinha para passear na praia, pegou um táxi e lá chegando soltou o Juquinha e ficou só olhando. Sem que ela percebesse, o Juquinha soltou um barro fedorento na areia da praia.

À noite, o meu amigo com a Mimi parou na barraquinha de cachorro-quente indicada por ela, depois ele chamou-a para ver as estrelas e escutar o barulho das ondas, ela disse que não ia porque poderia encher sua roupa de areia da praia, ele então pegou no carro a sua japona e estendeu na areia.

Ele disse: olha o cometa.

Ela: tô vendo as estrelas.

Na outro dia, pela manhã, Dona Marieta falou com ele: sua japona tá toda suja de fezes de cachorro, por onde você andou?

Meu amigo ficou vermelho, não sabia o que falar. Desviou o olhar e viu o Juquinha rindo.

Ontem foi a missa de sétimo dia do meu amigo.

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