Procura-se um Sorriso

por abril/2009Crônicas0 Comentários

Hoje eu vou contar a história do meu amigo, “Jorginho Sorriso“. Ele só vivia rindo, era uma alegria constante, ria até do Plano Real.

Morador de São Gonçalo, rapaz responsável, chefe de família exemplar e bom orador – aliás era a única hora que não sorria, pois ficava muito compenetrado na mensagem que ele transmitia aos seus ouvintes.

Devido aos seus conhecimentos religiosos e ao dom da oratória, vira e mexe ele era convidado a fazer o uso da sua eloquência em vários acontecimentos: casamentos, batizados, inaugurações, homenagens em geral e até em enterros, quando era sua a última palavra antes do sepultamento.

Certa ocasião em pleno verão, ele foi convidado a prestar a última homenagem a um amigo de infância. O amigo Tonho que havia falecido. De pronto ele concordou.

O único problema existente, era o local do enterro, pois seu amigo há muito tinha fixado residência em uma cidadezinha do sul da Bahia, chamada Caravelas.

Jorginho Sorriso não se fez de difícil, foi. O amigo de estripulias na tenra idade bem que merecia aquele sacrifício, afinal seria o último adeus.

Ele levava no bolso o discurso bem preparado, embora o tempo tenha sido curto para a elaboração. Ele embarcou na Rodoviária, para uma viagem de 16 horas.

O mês de janeiro já se despedia daquele ano, prometendo voltar no próximo, acompanhado do sol, seu companheiro inseparável.

No regresso, no interior do ônibus, “viajando em pensamento”, vamos encontrar meu amigo Jorginho Sorriso recapitulando os acontecimentos: a sua chegada à cidade, o cansaço da viagem, a moqueca de siri mole, o picolé de mangaba, o munguzá, o sepultamento com toda a cidade presente: Prefeito, Vereadores, Juiz, Padre. E a última palavra foi a sua. Ele realmente se sentiu importante diante de todas as autoridades locais. Um sorriso aflorou. Os olhos continuavam cerrados. Ele sentia a satisfação do dever cumprido. Não via a hora de chegar em casa no bairro do Monjolos e abraçar sua esposa Marieta.

Meu amigo estava sentado na poltrona do lado do corredor, tendo como companheiro, na janela, um senhor que atendia pelo nome de Baiano de boa cepa, que havia aproveitado as férias no trabalho para ir rever a sua cidade natal, e trazer algumas coisinhas para fazer um agrado aos familiares que não puderam viajar.

Jorginho Sorriso já estava quase dormindo, porém seu vizinho, Zé dormiu primeiro. A partir daí começou o seu pesadelo. Zé tinha um ronco sincronizado, assobiava, rangia os dentes, engasgava, tudo em sequência. Jorginho Sorriso não sabia mais o que fazer para acabar com a sinfonia do Zé.

Porém, em um buraco vadio na estrada – aliás as estradas brasileiras parecem queijo Suíço – o ônibus bateu e quicou. Zé acordou. Jorginho sorriu, só que sua alegria logo acabou, pois algumas tralhas que Zé havia posto no bagageiro caíram e uma panela de barro acertou em cheio o cocuruto do Sorriso. O galo “cantou” na hora.

Caranguejo

Foto: Umberto Salvagnin

Meio zonzo, Jorginho Sorriso pensou consigo: deve estar chovendo muito, pois eu estou sentindo uma goteira bem em cima de mim.

Novamente preparou-se para dormir, descalçou os sapatos, esticou as pernas e estava quase cochilando quando seu vizinho Zé gritou:

– Olha o caranguejo!

Jorginho Sorriso se assustou, após sentir uma dor no dedão do pé. Lá estava grudado umcaranguejo.

A caixa de papelão que Zé havia trazido com vários caranguejos, quando da queda tinha se desamarrado e os crustáceos passaram a passear por baixo das poltronas.

– Olha o caranguejo – gritava o Zé . Todos suspendiam os pés, até o Jorginho com a meia furada no dedão.

Quando chegaram na Rodoviária de Niterói, o Zé reclamava com o Jorginho.

– Eu acho que os caranguejos tomaram da minha pinga. Olha, a garrafa está pela metade.

Jorginho Sorriso, finalmente chegou em casa. Sua esposa o aguardava.

– Foi tudo bem lá?
– Quase.

A esposa olhou espantada, perguntando:

– Você fez xixi nas calças?

Jorginho Sorriso então viu que estava todo molhado, lembrou da goteira, ia falar, porém a sua esposa emendou.

– Isto é cachaça!

Jorginho Sorriso quis tirar um lenço do bolso da camisa, do qual saíram alguns camarões secos.

A esposa aproveitou:

– É, a festa foi boa!

Jorginho Sorriso Amarelo, encabulado, tirou os sapatos.

A esposa bufando, concluiu.

– Meia furada, galo na testa, cheiro de cachaça. É, a farra foi muito boa!!!

Jorginho, perdeu o Sorriso.

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