A mulher o acordou cedo.
– Acorda, amor.
– Hoje é domingo, dia de descanso para todo trabalhador brasileiro.
– E desde quando você é trabalhador?
– Bom, eu posso não ser um operário padrão, mas nunca deixei faltar nada na nossa mesa.
– Não fala mentiras, que Deus castiga.
O dia amanhecia no Morro da Felicidade, local em que ficara o barracão do “Tiziu” e da sua companheira, a mulata Nazaré.
O morro também fora escolhido para receber um vazadouro de lixo. Era uma fedentina horrível. Porém, pobre não tem direito a reclamar. Assim acham as autoridades deste país.
“Tiziu” chegou à Praça Zé Garoto por volta das dez horas. Armou seus caixotes e abriu os sacos que trazia. Como a praça é do povo, ele apoderou-se do seu pedaço.
Tendo cursado a Faculdade da Vida e com uma longa experiência na difícil arte de camelotagem, “Tiziu” começou a apregoar a sua mercadoria.
– Atenção, distintos clientes.
Os transeuntes foram chegando, curiosos.
– Hoje é domingo, meu povo!
Mais gente chegando.
– Minha mercadoria é de primeira!
Os olhares furtivos se dirigiam para os sacos.
– Distinto público, eu resolvi, com muita tristeza, acabar com a criação de frangos que tinha lá na minha granja, no Morro da Felicidade. O preço do milho subiu e das rações também. Portanto, aproveitem a grande oferta do domingo.
O brasileiro já é chegado a uma fila. Não foi preciso nem o “Tiziu” mandar; logo, logo, a fila estava pronta.
– Meus frangos já estão depenados e sem cabeça. O preço é uma pechincha, cada um custa R$ 5,00 (“cinco real”), independente do peso, é só pagar e levar.
Vendo aquele tumulto na praça, o soldado que estava à paisana se aproximou. Quando se inteirou do que estava acontecendo pensou na “média” que poderia fazer com a “patroa” em casa. Tratou de tentar furar a fila.
Porém, as pessoas que estavam na mesma começaram a reclamar.
Mostrando a carteira, ele dizia.
– Eu sou autoridade!
“Tiziu”, malandro velho, vendo que não ia sobrar frango para a “autoridade”, disse:
– Ô, amigo! Os seus dois já estão separados, são os mais gordinhos.
O soldado, satisfeito, pegou os frangos, pagou e saiu.
“Tiziu” vendeu todos os trinta frangos em trinta minutos.
O soldado, todo contente com seus frangos, caminhava para o ponto de ônibus, quando encontrou um amigo cabo:
– Você está de serviço hoje.
– É, estou vindo de uma blitz com o pessoal do Exército.
– Aonde foi?
– Foi lá no Morro da Felicidade.
– Teve muita encrenca?
– Não, a única coisa que aconteceu foi que os helicópteros, quando sobrevoaram o Morro, espantaram os urubus que estavam no vazadouro. Eles levantaram voo apavorados, se chocaram contra as hélices, morrendo degolados.
– Que loucura!
– E o pior: teve um morador que apanhou e ensacou todos. Devia ter uns trinta.
O soldado deu um pulo como se tivesse recebido um choque. Correu em direção ao local onde estava o “Tiziu”. Furioso, por não o ter encontrado, atirou os “frangos” longe.
“Tiziu”, depois de passar no abatedouro do Sr. Manel, abre a porta do barraco, dizendo:
– Tá aqui, nêga! Com o nosso frango, porque hoje é domingo.
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