Aquela era uma família pobre.
Morava em uma casa alugada de quarto, sala, cozinha, banheiro e um mini-quintal, cercado por um muro alto. A família se compunha de pai, mãe, dos meninos de 7 e 2 anos, uma menina de 5 anos e o ponto de equilíbrio, uma avó. O pai estava desempregado e não fazia por onde arranjar algo para fazer, vivia nos bares da vida, tomando todas. A mãe, então, vendo aquela situação, teve que partir à luta. Começou a trabalhar como enfermeira durante a noite e estudar de dia. Às vezes, saindo direto dos plantões para a sala de aula.
O filho mais velho, que era o “esquindim” da avó, parecia um “pau de virar tripa”, de tão magro, uma vara de bambu. Também, pudera, só queria batata frita e toddy, copo cheio. Não comia mais nada. A menina, quando estava arrumada, ficava tal qual uma boneca, com seus cabelos em cachos.
Certa feita, a menina queria por que queria um pedaço de maçã que o pai comia. Fez manha, chorou, armou o maior circo. O pai com raiva cuspiu na maçã e ofereceu à menina, que aí não aceitou e calou-se, indo para um canto triste. O outro menino era um pouco doentinho, o que o salvou foi a carne de rã, um santo remédio.
A avó era o membro da família que possuía melhores condições financeiras, graças à pensão que recebia do marido falecido. Ela socorria a todos, dava dinheiro pro pai comprar cigarros e fazer compras. Só que ele tirava um pouco para as pingas, comprava balas para as crianças, sempre mais pro queridinho.
Certa feita, uma tia deu ao filho mais velho um coelho, com a promessa de que ele passasse a comer de tudo. O colho tinha o pelo pretinho, os olhos vermelhinhos e uma alegria imensa. O menino, quando o viu, se apaixonou no ato. O afeto do coelho foi recíproco, pareciam amigos há muito tempo. O consumo de batatas fritas e de toddy aumentou. Tudo que o menino comia, dividia com o seu amigo.
O pai, certa ocasião, chegou de noite em casa um pouco alcoolizado e esqueceu-se de fecha o portão. Quando a avó deu por conta o coelho tinha saído. E agora? Perguntou a avó. Vai diminuir a despesa! Retrucou o pai.
Mas, para felicidade geral, horas depois a avó escutou um barulho no portão, então fechado. Sim, lá estava o “Borró”, pois esse era o nome que o menino havia dado ao coelho. A partir daí, todas as noites o “Borró” saia para seu passeio noturno. E voltava sempre.
Porém (sempre existe um porém), outra noite ele não voltou mais. O menino não parava de chorar, não queria comer nem tatás fritas e nem saber de toddy. Seus olhos já estavam da cor dos olhos do “Borró”: vermelhos. A avó rezava um terço todos os dias. A mãe fez promessas. O pai bebia mais e dizia que era de tristeza por causa do filho.
Em uma determinada manhã, o menino amanheceu sem chorar. A avó indagou o que ouve e o menino respondeu: – Vó, eu vi o “Borró” ontem à noite. – Onde? Perguntou a avó, surpresa. Eu estava dormindo e vi. Ele estava no colo de um homem vestido de branco, com uma barba e um arco-íris em volta de sua cabeça. O homem estava sentado em um trono e parecia um Rei. Ele passava as mãos nos pelos de meu amigo “Borró”, que estava feliz. – Que mais? Quis saber a avó. – O homem disse que estava cuidando de “Borró” para mim, até eu ir para lá.
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